Reflexões sobre os protestos no Brasil

19 junho 2013


   Depois de muito tempo sem escrever nada, resolvi retomar esse hábito depois das manifestações que estão ocorrendo pelo Brasil. Não tenho ideia do tamanho do texto que vou produzir, pois estou apenas começando a escrever, mas tenho quase certeza que será bem extenso. Portanto, me perdoem desde já pelo tamanho do texto.
   São vários os aspectos que creio são importantes para a reflexão e pretendo trabalhar a maioria deles por aqui.
   Pra mim o mais importante das recentes manifestações não é o que poderá produzir em termos concretos nas possíveis reduções de tarifas ou outras atitudes que os governantes possam tomar na tentativa de estancar os protestos. Na verdade, o mais importante nisso tudo é o despertar da cidadania brasileira. Estávamos estagnados na mesmice, no conformismo cotidiano. Cada vez mais ouvíamos a frase “não gosto de política” como se isso fosse uma coisa boa, desejável. Ficávamos anestesiados discutindo a novela, aprendendo com ela como de fato os maus cidadãos, os maus seres humanos eram mesmo mais interessantes, os que mais conquistavam as coisas, enquanto os quase abobados “mocinhos” levavam porrada da vida dia após dia. As pessoas acreditaram que aquilo era verdade e se acostumaram com a ideia de que não podíamos fazer nada em contrário, já que “o mundo é assim”.
   Para aqueles que me dizem não gostar de política, eu sempre recomendo retirar-se para as montanhas e viver como um verdadeiro eremita, pois não é possível viver em sociedade, conviver com outros seres humanos, sem estar permanentemente envolvido com a política. E falo de todo o tipo de política, pra ficar claro, falo também da política partidária. Claro que fica mais fácil falar mal dos políticos e se manter bem longe da política partidária, pois aí o argumento inclusive se fortalece. Porém, está muito claro que o não envolvimento com ela só traz benefício para aqueles que se utilizam dela para aniquilar o interesse público e se aproveitar do que é de todos em benefício próprio. É necessário compreendermos que se é esse o sistema posto, se é a partir da política partidária que se dá a representação da população, é a partir dela que essa mesma população deve construir a sua “revolução”.
   Um ponto importante é tentar compreender o que tem acontecido, pois tenho visto muita gente tentando compreender as manifestações que estão ocorrendo, conforme os referenciais construídos em tempos passados. Quero crer que isso não é mais possível. O fenômeno das redes sociais modificou toda a compreensão de movimentos sociais “organizados”. Em outros momentos, identificávamos uma CAUSA de protestar, um SEGMENTO da sociedade e LIDERANÇAS identificadas. Nenhuma dessas premissas é mais possível identificar. Com o fenômeno das redes sociais, os movimentos de protesto são pulverizados em suas causas, pois as pessoas vão aderindo a ideia central de protestar, mas carregam o seu propósito pessoal de manifestação, pois as redes sociais pressupõem diversidade de segmentos, sejam eles socioculturais, econômicos, profissionais, etc. Por essa pulverização de articulação, fica também prejudicada a identificação de lideranças, pois a partir do primeiro retweet ou compartilhar, perde-se a identidade da autoria da mobilização. Portanto, creio que essa mobilização não necessita de força política para conseguir aprovar isso ou aquilo, para derrubar esse ou aquele, pois ela se presta fundamentalmente para fazer as pessoas acordarem para a possibilidade de ser protagonista da vida em sociedade.
   Isso tudo, para ter consequência, deve ser capaz de fazer nascer em nós algumas reflexões importantes. Coisas como por exemplo: como posso protestar contra a corrupção, se sou capaz de realizar pequenas infrações diariamente? Se a corrupção é pequena ou maior, me parece que depende fundamentalmente da oportunidade que se apresenta. Se sou capaz de encontrar um justificativa para “pequenas corrupções cotidianas”, serei mesmo capaz das grandes corrupções se tiver oportunidade. Precisamos parar de imaginar que as pequenas infrações podem ser toleradas; preciso levar mais a sério a política, participar das discussões, procurar buscar informações, votar com consciência, por acreditar no projeto e depois ser capaz de cobrar as promessas e não reconduzir aqueles que não cumprem seus projetos de campanha. Se preciso for, participar ativamente da política partidária, sem aceitar “a vida fácil” dos “oportunidades” que se colocam a nossa frente quando estamos envolvidos nesse processo. Sermos capazes de retomar o valor do interesse público, valor esse quase  esquecido por todos, já que o individualismo, o consumismo exacerbado, a busca da satisfação pessoal a qualquer custo, nos distanciam cada vez mais desse valor.
   Poderia escrever mais, mas vou deixar para os próximos posts. O importante é dizer que isso tudo faz parte do nosso dever de cidadão. Na verdade, para aqueles que, como eu, se identificam como cristãos, esse dever é ainda mais importante. Lembro aqui o que disse o nosso querido Papa Francisco: “Envolver-se na política é uma obrigação para um cristão. Nós, os cristãos, não podemos fazer de Pilatos e lavar as mãos, não podemos! Temos de nos meter na política, porque a política é uma das formas mais altas de caridade, porque busca o bem comum. Os leigos cristãos devem trabalhar na política. A política está muito suja, mas eu pergunto: está suja porquê? Porque os cristãos não se meteram nela com espírito evangélico? (..) É fácil dizer que a culpa é dos outros. Mas eu, o que eu faço? Isto é um dever! Trabalhar para o bem comum é um dever do cristão.” E para aqueles que não são cristãos, vale a pena alterar no texto do Papa a palavra cristão por cidadão que a mensagem continua verdadeira.

   Manifestem-se!